Preparados para perder

Preparados para perder

 

 “No mês de julho, foram disputados outros Jogos Olímpicos: os escolares. Tivemos as Olimpíadas de Química, Física, Matemática e Biologia. Das 142 medalhas de ouro distribuídas nessas competições, o Brasil ganhou... zero”

O Brasil foi excepcionalmente bem nos últimos Jogos Olímpicos. Com catorze medalhas de ouro, ficamos em 14.º lugar da Paraolimpíada de Atenas. Na última Olimpíada convencional, o Brasil teve desempenho pífio: três ouros, 23.º posição, atrás de países como Jamaica, Quênia e Etiópia. Creio que essa diferença de performance entre os dois tipos de competição não seja totalmente acidental.

As razões costumeiras não parecem explicar bem os motivos do nosso fracasso. O primeiro vilão apontado é a pobreza. Mas o Brasil hoje é a décima economia do mundo, não a 23.ª.

A segunda razão comumente é pouco investimento em esporte no país. Em 2008, não foi o caso. Segundo a Folha de S. Paulo, apenas o governo federal investiu 1,2 bilhão de reais em esportes olímpicos desde Atenas. Sem incluir o orçamento de fontes próprias do COB, esse valor significaria um custo de 400 milhões de reais por ouro. O custo do Comitê Olímpico americano – financiado basicamente sem dinheiro público ­– foi de32 milhões por ouro.

A impressão que ficou de nossos atletas é que seus fracassos se deveram mais a questões psicológicas do que financeiras ou estruturais. E isso importa não por causa da Olimpíada, que tem valor apenas simbólico, mas porque essa mentalidade se reproduz em toda vida nacional, com consequências reais

Não temos apenas carências materiais a nos complicar a vida: temos uma cultura que abomina a competitividade, desconfia dos vitoriosos e simpatiza com os fracassados. Quando o nadador César Cielo, não por acaso treinado nos EUA, declarou que iria em busca do ouro, o desconforto dos comentaristas televisivos foi audível: muita saliva gasta para deixar bem claro que se tratava de “autoconfiança” e não “arrogância”. Porque melhor um bronze humilde do que um ouro arrogante! Se Michael Phelps tivesse nascido no Brasil, seria provavelmente exilado ao declarar a intenção de bater o recorde de medalhas em uma Olimpíada. Só num país de perdedores uma classificação para final Olímpica é vista como “garantia de prata”, e não uma chance de 50% de ouro. Só no Brasil se ouvem atletas dizendo que o bronze valeu ouro, só aqui se vê um chororô constante e público de favoritos que foram vencidos por seus nervos. Só aqui um atleta como Diego Hypólito, depois de ter caído sentado em sua competição e ainda ter a pachorra de culpar os céus (“Deus não quis. Deus decidiu isso.”) é recebido com festa e escola de samba. Nós nos preocupamos mais em ser campeões morais do que campeões de fato. Valorizamos o esforço mais do que o resultado. Acreditamos que o sofrimento do percurso redime o fracasso da chegada, ao contrário dos países que dão certo, em que o sucesso do resultado é que redime o sofrimento do percurso.

Gustavo Loschpe – 29 de agosto de 2008.